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Suzana Machado Padua

Presidente do IPÊ e ESCAS

É doutora em desenvolvimento sustentável pela Universidade de Brasília e Mestre em educação ambiental pela Universidade da Flórida (EUA). Mestrado e MBA, este em parceria com o CEATS/USP.

Atua em educação ambiental desde 1988, quando criou e coordenou por três anos um programa no Pontal do Paranapanema em São Paulo ligado a áreas naturais, espécies ameaçadas e envolvimento das comunidades locais.

É cofundadora e presidente do IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas e da Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade - ESCAS, por meio da qual a instituição oferece cursos de curta duração em diversos campos socioambientais

IPE – Instituto de Pesquisas Ecológicas

O IPÊ é uma instituição dedicada à conservação da biodiversidade em bases científicas. Atua em pesquisas, formação de profissionais, educação ambiental e programas de geração de renda e negócios sustentáveis que ampliem a responsabilidade socioambiental de comunidades, empresários e formadores de opinião.


ENTREVISTA

Suzana Pádua

13 de dezembro de 2022

Oriana White

MODERADORA

Juliana Lotti

TRANSCRIÇÃO

 

COMO TER RECURSOS A LONGO PRAZO?

Dois conselheiros nossos, falam muito isso, que a empresa não é fria, ela é de gente, e cultivar as pessoas, lembrar o que você está fazendo o tempo todo, mandar notas.

vPor exemplo para o nosso conselho, eu mando notícias boas, as vezes tem coisas que não são boas, mas eu mando as notícias, por exemplo, hoje saiu uma notinha no jornal, um artigo, eu mando para o conselho, porque todos eles são coautores.

Se eles estão acreditando em nós, eles estão assinando embaixo do que nós estamos fazendo, então eu acho que a gente tem que cultivar.

A Havaianas, quando a gente começou, não achávamos que iam durar tanto tempo, podia ter terminado, mas já estamos na terceira direção, mudou a presidência 3 vezes e continua.

Eles mandaram agora, eles fizeram não sei quantos anos, e saiu uma reportagem grande no jornal, página inteira, deles mencionando o IPÊ 3 vezes!

Então eles também têm orgulho da nossa parceria, então é uma troca.

Às vezes a ONG vai como pedinte, que era o que a gente fazia no início, e não, você está dando uma oportunidade, de algum jeito, dele estar participando de um bem maior, que é o bem que a ONG está fazendo.

Tem que ter um casamento de ideais, por exemplo, o Juscelino Martins que é o nosso porta-voz lá dentro, ele é apaixonado por natureza, então é claro que fica mais fácil você conversar.

Se a organização para a qual você está pleiteando algum apoio não se interessa pela sua causa, você não vai ter tanto sucesso, agora o cultivo dessa parceria é trabalhado o tempo todo.

Essa entrevista que eu estou te dando, quando sair, eu vou mandar tanto para Havaianas quanto para o Martins, porque eu estou ajudando, de algum jeito, a fortalecer o nome deles e são parceiros pelos quais a gente tem muito orgulho e que entendem todos os desafios que nós passamos.


Transcrição Integral


TÓPICOS DA ENTREVISTA


  1. Um pouco da história
  2. O prazer de deixar um legado
  3. Os grandes desafios do Ipê
  4. Transparência e credibilidade: fatores de sucesso
  5. O propósito de conservar a vida
  6. Fundamental é a ousadia do sonho
  7. Como ter recursos a longo prazo
  8. O sabor da primeira empresa que acredita em você
  9. O apoio começa no curto prazo
  10. A importância da comunicação
  11. Chegando às Políticas Públicas
  12. Grandes sugestões para os pequenos

1. UM POUCO SOBRE SUZANA PÁDUA E O IPÊ

Meu nome é Suzana Pádua, sou casada com Cláudio Pádua.

Para entenderem como o Ipê nasceu, o Cláudio aos 32 anos, começou a ter uma forte crise depressão, dizendo que não era aquilo o que ele tinha vindo fazer na vida.

Ele trabalhava com administração de empresas, era bem-sucedido, mas estava infeliz.

Resolveu mudar de vida e trabalhar com conservação de natureza.

Todos achavam que ele estava louco, eu inclusive, o que aconteceu foi que de fato era isso o que ele veio fazer.

Voltou para a universidade, fez biologia, conseguiu bolsa nos EUA para fazer mestrado e doutorado.

Porque eu conto isso, porque a mudança minha de vida, também decorreu dessa mudança do Cláudio.

Quando a gente foi pro Pontal do Paranapanema, onde tinha espécie que ele queria salvar, que era o mico leão preto, que estava entre as 10 espécies mais ameaçadas do mundo na época, eu era designer.

Eu trabalhava nisso durante muitos anos e comecei a ficar muito impressionada com a falta de consciência que as pessoas tinham, em relação à importância da natureza e ali era um dos últimos redutos de habitat dessa espécie, do mico leão preto.

Comecei a trabalhar com educação ambiental, que não só incluiu as crianças, estudantes na verdade, 100% das escolas todos visitaram o parque, mas nós montamos um programa dentro do parque, o parque estadual do Morro do Diabo, que é administrado pelo estado de São Paulo, pelo Instituto Florestal de São Paulo.

E lá a gente começou a desenvolver um programa de sensibilização, de amor pela natureza e aí a gente percebeu que não dava tempo dessas crianças crescerem, as perdas eram muito intensas.

Então tinha tido um aeroporto dentro do parque, uma estrada que cruza o parque e sempre em nome do progresso.

Então em nome do progresso você pode fazer coisas muito cruéis para a natureza e aí eu comecei a trabalhar com os adultos também, fazendo eventos, festival de música ecológica ou visitação ao parque com prêmios etc.

E o programa pegou então a minha grande alegria, quase que 20 anos depois, eu fiz o meu doutorado e vi a diferença de concepção.

No início era porque não destrói essa mata, que não serve para nada, e bota gado que pelo menos vai me dar leite e essa era a mentalidade da época,

Hoje o parque é a riqueza da região!

Mas nesse processo, tanto o Cláudio como eu tínhamos estagiários, a gente sempre acreditou que a gente estava sendo muito privilegiado de estudar nos Estados Unidos, acabei fazendo mestrado nos Estados Unidos e de ter uma gama de conhecimentos que no Brasil não havia.

Então esses estagiários vieram e muitos estão conosco até hoje, eles foram a semente do Ipê.

Nós criamos o Ipê, na verdade, dentro da Esalq que é a escola de florestas da USP, porque a nossa ideia era fazer uma parceria, a parceria não deu certo.

Mas a escola do Ipê, a ESCAS (Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade) é um braço, na verdade ela está dentro do DNA institucional.

Nós montamos cursos curtos sobre o assunto, para as pessoas não terem as mesmas dificuldades que nós tivemos, depois quando já tínhamos mais de 10 doutores nós aplicamos para a Caps e fomos aceitos como credenciados para oferecer um mestrado e também oferecemos um MBA, com a Fea da USP.

Porque a gente quer de algum jeito influenciar o setor privado com sustentabilidade.

O setor privado tem um poder imenso, com o governo é mais difícil da gente trabalhar, a gente trabalha muito, mas com os órgãos ambientais, então mudar a política pública, por exemplo, quando você consegue, é maravilhoso, porque uma coisa pequenininha se torna gigante, mas é difícil para você chegar lá, principalmente uma ONG.

Então foi assim que nós começamos e essas pessoas hoje, né essas sementes de Ipê, estão todos, na verdade, florindo, espalhando as suas próprias sementes, o que é muito bonito.

Cada um deles, hoje, é coordenador de um projeto com várias pessoas, também júniores, e vão cada vez se fortalecendo para seguir em frente.

É um resumo bem resumido da nossa história, mas nós começamos lá no Pontal, que era a segunda região mais pobre do estado de São Paulo, também pensando no lado social.

O lado ambiental pro Ipê ele não vem sozinho, ele tem uma visão sistêmica, a gente precisa mudar, dar oportunidade para quem não teve e dar alternativas de renda.

Nós pegamos um Pontal, depois que nós estávamos lá, chegaram 6000 famílias de assentados e começamos a trabalhar com assentamentos, não exatamente com o MST, claro que a gente conversa com o MST, porque as decisões, muitas vezes, são tomadas pelos líderes, mas na verdade, a gente trabalha com as pessoas já assentadas.

Infelizmente o sistema também é meio cruel, porque o governo dá um pedaço de Terra, mas depois eles se sentem muito abandonados, eles estão lá empobrecidos e precisando de algum caminho.

Hoje, para quem tiver interesse, tem vários filmes sobre os corredores de vida, que estão sendo implantados no Pontal, tem um em inglês “Corridors for life”, se a gente googar, a gente chega nele, são uns sete minutos, mas que mostra tudo.

Mas tem muito Globo rural, Globo repórter, tudo isso a Globo já cobriu os nossos programas, tanto lá, como aqui em Nazaré Paulista, onde é a sede do IPÊ.

Aqui o tema é água, porque a gente fornece esse sistema Cantareira, onde nós estamos, faz parte do Rio Atibainha, bem próximo do IPÊ, que fornece água para mais de 7.000.000 de pessoas da cidade de São Paulo, Campinas e outras regiões.


2. O PRAZER DE DEIXAR UM LEGADO

Eu adoro, adoraria te dizer que é um fato consumado, que a gente conseguiu, a gente realiza muita coisa e eu fico muito feliz.

Tenho um legado, o IPÊ, sei que quando eu for embora desse mundo, eu deixei um legado, mas tem tanta coisa para ser feita.

O Brasil é mega diverso, é um país que mais tem e para mim é a maior riqueza brasileira e não só no campo ambiental, cultural também.

Só no Rio Negro, pra ter uma ideia, tem mais de 22 línguas indígenas, então a língua indígena, para se desenvolver, é quase como uma nova espécie.

O desenvolvimento é lento, é cultural, exige toda uma convivência daquele povo, então a gente tem uma riqueza extraordinária, aliás o IPÊ tem o primeiro mestre, ele vai se formar agora, indígena, é a primeira vez que temos um aluno indígena e que nos dá muito orgulho, porque foi um desafio para e para nós, foi um aprendizado pra todo mundo, dá muito orgulho porque a gente precisa ampliar o nosso leque.

Todo mundo fala muito de gênero, de inclusão, de raça, mas é fundamental mesmo porque ele traz outros olhares para nós, daquilo que a gente já está fazendo, então só enriquece.

Infelizmente, o brasileiro não valoriza toda essa riqueza e é por isso que nós estamos deixando isso tudo se esvair, então a Floresta em pé, ela tem que valer a mais do que só gado, ela precisa valer mais.

Nós estamos também trabalhando com bioeconomia, nós estamos na Amazônia e a gente começou no Pontal do Paranapanema e depois a gente veio para Nazaré, hoje estamos no Pantanal, no cerrado e muito na Amazônia.

A gente está trabalhando, principalmente com as unidades de conservação, em parceria com ICMBio, mas também com os governos locais e a nossa ideia é realmente dar chance para que essas áreas sejam de fato valorizadas, porque se as pessoas do entorno, se as pessoas locais passarem a valorizá-las, a chance de proteção é imensa.

Enquanto você tem a área protegida, que tudo é proibido, aquelas pessoas se sentem alheias, elas se sentem fora e a área natural passa a ser um empecilho para o progresso e nós queremos uma mudança grande de concepção, mostrando que é possível você manter a natureza e protegê-la e de algum jeito envolver as pessoas locais que elas também ganhem, que elas também tenham uma esperança, uma luz no fim do túnel e a vida delas também pode ser melhor, desde que de fato protegido.


3. OS GRANDES DESAFIOS DO IPÊ

Eu fico o tempo todo pensando que o grande desafio é de algum jeito sensibilizar as pessoas, de algum jeito dar uma acordada nas pessoas para que elas percebam, nós somos natureza, nós fazemos parte de todo esse sistema e quem é brasileiro tem essa responsabilidade a mais que é proteger toda essa riqueza.

Eu acho que o maior desafio, para mim, é de algum jeito, descobrir maneiras de tocar o cérebro e o coração das pessoas, para que a gente consiga planejar um Brasil mais sustentável de fato.

Existem muitos desafios que a gente enfrenta no dia a dia, busca de Patrocínio, de apoio, parcerias que são sólidas e parcerias com quem a gente tem, vamos dizer, muito orgulho de ser parceiro.

Eu acho que eu posso dar aqui dois exemplos, o primeiro parceiro brasileiro que acreditou na gente, a primeira empresa brasileira que acreditou na gente foi o grupo Martins, de Uberlândia, que distribui para todos os supermercados do Brasil.

É uma empresa de logística, um dos filhos é nosso conselheiro inclusive, e ele ama a natureza, então a fala fica muito fácil e ele nos abriu a porta também para Havaianas.

Existe uma coleção Havaianas IPÊ, há 18 anos, são as espécies brasileiras estampadas na sola das sandálias.

O brasileiro tem acesso à biodiversidade brasileira, a biodiversidade nacional, tem sempre a curiosidade de saber mais, se for o caso, mas também dão 7% da renda daquela coleção pro IPÊ. Com isso IPÊ teve um upgrade.


4. TRANSPARÊNCIA E CREDIBILIDADE FATORES DE SUCESSO

A gente hoje passa por auditoria, nós somos extremamente rigorosos com toda a nossa gestão.

Então o ESG, que todo mundo fala, na verdade, dentro do IPÊ, ele está sendo aplicado na nossa veia, ele faz parte de cada galho, da árvore do IPÊ.

A gente tem que ter essa preocupação, se a gente quer ter credibilidade, e claro, tem muito questionamento sobre a credibilidade das ONGs, então a gente tem que ser a vitrine, a gente tem que ser o modelo transparente de tudo que a gente fala aqui, para não ter dúvida.

O IPÊ não é o único, eu conheço várias organizações que são muito sérias, eu fico defendendo elas o tempo todo quando eu ouço as barbaridades que a gente tem ouvido, que as ONGs estão ali para ganhar dinheiro.

Nossa se eu quisesse ganhar dinheiro, sinceramente teria escolhido outra profissão, mas a profissão que a gente tem, que eu escolhi, não abro mão.


5. O PROPÓSITO DE CONSERVAR A VIDA É A FORÇA MOTRIZ

Também tem uma coisa que eu acho muito importante, que está muito ligada ao jovem de hoje, nós trabalhamos por um propósito nobre, porque a conservação da vida, é mais do que a natureza, é do outro ser humano, é do meu companheiro.

Eu posso não ter a noção de quem você, mas a sensação de você estar trabalhando por uma causa que vai proteger as florestas, as pessoas que moram perto, dar chance a elas de melhorarem, tudo isso nos traz uma gratificação imensa e hoje, eu ainda tenho esse privilégio, de dizer que não é só a equipe do IPÊ, porque nós começamos com 6-8 pessoas em 92 e hoje somos mais de 100 espalhados pelo Brasil afora.

Nós estamos numa organização bastante grandinha, mas o mais legal de tudo isso, são os alunos, que eu digo que são as sementes, de estarem espalhadas pelo Brasil.

Eles também estão fazendo coisas lindas.

Então se a gente olhar os alunos que passaram ou pelos cursos curtos ou pelo mestrado, a gente está com 186 mestres formados e claro, vai chegar em 200 muito rápido, porque tem vários que estão em processo de defesa, e também do MBA e cada um que sai, eles levam um pouquinho da nossa essência.


6. FUNDAMENTAL É A OUSADIA DO SONHO

Uma coisa que eu acho fundamental, em qualquer área, mas que as pessoas esquecem, é a ousadia do sonho.

A gente precisa reaprender a sonhar e a sonhar não para que a minha conta bancária fique maior, isso também é muito bom, eu não vou dizer que não, mas é além, eu quero sonhar por um Brasil melhor, por um planeta melhor e eu sei que pode parecer piegas, mas é exatamente isso que eu sinto.

Então é um tópico ótimo, a utopia ela surge de um sonho, então a gente está dando chances para que jovens, como são os nossos estudantes, a maioria claro, que eu tenho também alunos de todas as idades, mas para que os jovens entrem e entendam que os sonhos deles precisam ser levados a sério, que eles podem fazer uma diferença grande no mundo se eles fizerem bem feito.

Não importa essa coisa de dizer... Ah... mas vai morrer de fome, não.

Quando saí de designer, quando o Cláudio saiu de administração para estudar biologia, a família inteira achou que nós íamos morrer de fome.

Eu sustentei a casa 3-4 anos, mas quando se faz bem feito e com paixão, a coisa, o retorno vem, então é não parar de estudar, é não parar de se aperfeiçoar e é também pensando de como você, vai de algum jeito, compartilhar as lições aprendidas.

O que não deu certo, que as pessoas podem evitar e o que deu certo e não ter medo da competição, quem é bom vai ser bom, pronto, e vai fazer um trabalho bem-feito e vai contribuir para a questão pela qual está trabalhando.


7. COMO TER RECURSOS A LONGO PRAZO?

Dois conselheiros nossos, falam muito isso, que a empresa não é fria, ela é de gente, e cultivar as pessoas, lembrar o que você está fazendo o tempo todo, mandar notas.

vPor exemplo para o nosso conselho, eu mando notícias boas, as vezes tem coisas que não são boas, mas eu mando as notícias, por exemplo, hoje saiu uma notinha no jornal, um artigo, eu mando para o conselho, porque todos eles são coautores.

Se eles estão acreditando em nós, eles estão assinando embaixo do que nós estamos fazendo, então eu acho que a gente tem que cultivar.

A Havaianas, quando a gente começou, não achávamos que iam durar tanto tempo, podia ter terminado, mas já estamos na terceira direção, mudou a presidência 3 vezes e continua.

Eles mandaram agora, eles fizeram não sei quantos anos, e saiu uma reportagem grande no jornal, página inteira, deles mencionando o IPÊ 3 vezes!

Então eles também têm orgulho da nossa parceria, então é uma troca.

Às vezes a ONG vai como pedinte, que era o que a gente fazia no início, e não, você está dando uma oportunidade, de algum jeito, dele estar participando de um bem maior, que é o bem que a ONG está fazendo.

Tem que ter um casamento de ideais, por exemplo, o Juscelino Martins que é o nosso porta-voz lá dentro, ele é apaixonado por natureza, então é claro que fica mais fácil você conversar.

Se a organização para a qual você está pleiteando algum apoio não se interessa pela sua causa, você não vai ter tanto sucesso, agora o cultivo dessa parceria é trabalhado o tempo todo.

Essa entrevista que eu estou te dando, quando sair, eu vou mandar tanto para Havaianas quanto para o Martins, porque eu estou ajudando, de algum jeito, a fortalecer o nome deles e são parceiros pelos quais a gente tem muito orgulho e que entendem todos os desafios que nós passamos.


8. O SABOR DA PRIMEIRA EMPRESA QUE ACREDITA EM VOCÊ

A primeira empresa que acreditou, foi a mais difícil.

Então eu digo para as pequenas, a gente tem que achar alguma que acredite, porque é mais fácil uma vez que você tem alguma que acredite em você.

Por exemplo, se eu for ter uma reunião em alguma grande empresa, eu ligo para a secretária e pergunto por favor você se incomoda de me passar quanto calça o seu diretor e você também, porque eu levo pra secretária também, eu levo um par de Havaianas IPÊ.

Porque é um cartão de visitas se a Havaianas está acreditando na gente, agora tem 18 anos.

Começamos pequenininho, eu não quero desanimar ninguém que esteja ouvindo, ... as pessoas entram aqui, no IPÊ e dizem, vocês são grandes, mas nós não éramos, nós começamos pequenos.

É um cultivo de gente para a gente e às vezes dá certo, às vezes não dá e às vezes mudam o diretor e esse diretor novo não está nem aí para sua causa, aí acabou, não vai ter jeito, você não vai conseguir emplacar.

Então é assim é sensibilidade, usar bom senso, mas é normal mesmo, no início foi muito difícil, tanto que como é que a gente sobreviveu, até então eram propostas abertas, fundo nacional do meio ambiente, eram chamadas, Petrobras ambiental que é um grande apoiador do IPÊ até hoje e muitas fundações de fora.

Hoje a gente tem More Foundation, junto com BNDS, mas claro, a gente está num estágio porque assim, bem BNDS, sinceramente, só para quem já está grandinho, porque é todo um processo que exige, que não é fácil, então você tem que ter uma estrutura bem montada para você ter, mas a gente não chegou lá à toa, a gente foi galgando os graus.

Eu acho que é importante a gente ter essa consciência de que a gente precisa cultivar as nossas parcerias, assim como a gente cultiva os amigos, assim como a gente cultiva a nossa equipe.


9. O APOIO COMEÇA NO CURTO PRAZO

Os recursos dependem muito da área que você está trabalhando.

Por exemplo, na minha área que é socioambiental, no início, a gente teve muito apoio do Boticário.

O Boticário tem um edital aberto, a Petrobras ambiental é um edital aberto, então eu estou falando da minha área.

Mas na educação devem ter algumas instituições que apoiam a educação, na saúde tem outras.

Eu sou dos fellows, da Ashoka, que é uma organização da qual eu tenho privilégio de fazer parte e eu vejo que todos eles estão sempre passando por desafios de conseguir apoios e principalmente apoio de longo prazo.

O apoio começa de curto prazo, você depois conquista o longo prazo.

E tem outra coisa também interessante, que é ganhar prêmios.

Pode parecer assim que ela quer se mostrar, claro que o ego fica bem infladinho, mas não é para isso, o ganhar prêmio equivale a você aparecer no jornal, a você poder compartilhar essa notícia com todo mundo que é influente.

Na hora que você vai ter uma reunião, ou você já coloca no seu currículo que você ganhou o prêmio, então você aumenta a sua credibilidade.

Eu me lembro que a gente foi pra Inglaterra ganhar o prêmio Whitley, que é como se fosse o Oscar da conservação e o Cláudio estava ganhando o prêmio sênior e a gente já sabia.

É mas é um prêmio muito sério, a Princesa Anne é a patrona, então você sobe ao palco,... “And the winner is..” e ela puxa no envelope e um dos nossos pioneiros do IPÊ, Laury Cullen Júnior que é o coordenador dos corredores de vida, estava concorrendo e eu falei para ele “Laurinho, deixa pro ano que vem, vai ser difícil ganhar, porque eles não vão dar os dois prêmios máximos, para dois brasileiros, da mesma instituição, eles não vão fazer isso” e ela anunciou o vencedor e era o Laurinho, aí nós três, um silêncio total, inglês uma cerimônia no Royal Geographical Society com 400 pessoas no auditório e nós 3 abraçados chorando.

Eu fico emocionada, não posso contar essa história, toda vez eu choro, mas foi muito emocionante, então o Cláudio ganhou o prêmio máximo de Sênior e o Laurinho o Withley Gold Award, que era o prêmio máximo dele.

Nós tínhamos levado o Marcos Sá Corrêa, que era um grande jornalista, que está infelizmente afastado por uma questão de saúde, mas ele era nosso conselheiro e ele foi junto e ele escreveu uma matéria na época, no jornal do Brasil de duas páginas, sobre o prêmio e contando a história da Royal Geographical Society, da importância que é, do prêmio Whitley, da Princesa Anne e de 2 brasileiros ganhando o prêmio e depois ainda brincou, dizendo que não tinha ninguém da embaixada do Brasil para aplaudir esses dois ganhadores.

Mas eu não quero nem falar nisso, porque pra mim era tanta alegria, tanta alegria, uma sensação da gente estar realmente participando de algo que é maior que a gente, então é essa sensação, o IPÊ é maior do que a gente, maior do que nós individuais e é esse coletivo, o tempo que eu tento passar em todas as nossas reuniões, é esse coletivo que a gente conseguiu criar, que eu acho que é exemplo para tanta gente, inspiração para tanta gente, que a gente precisa cultivar, porque o grande valor da gente é valor com conhecimento.


10. A IMPORTÂNCIA DA COMUNICAÇÃO

Ela é fundamental!

Dá tempo de eu contar uma historinha?

Então havia uma grande organização, que também apoiou muito, a Ashoka, que chamava Avina, ela ainda existe, mas está numa outra linha, e exatamente apoiava empreendedores, inclusive sou também líder Avina.

Pra gente entrar tinha que ter uma ideia inovadora e nós tentamos várias vezes, eles nem queriam ouvir.

De repente nos convidaram para apresentar uma ideia inovadora.

A nossa ideia inovadora era da unidade de negócios sustentáveis, ou seja, dentro de uma ONG tem uma unidade que vai tratar das parcerias com as empresas e também dos produtos comunitários para você conseguir fazer toda a cadeia produtiva chegar na ponta, chegar numa loja boa, para a pessoa da comunidade ter a chance de receber dando crédito a ela.

Nós queríamos criar isso e eles acharam inovador, mas o que eles falavam, vão receber (esse é um parêntese) tantos mil reais e um pouquinho dessa verba, vamos dizer 1/3 dessa verba, está guardado aqui, a mais, vai ser um adicional, mas vocês têm que fazer uma parceria com uma empresa Brasileira.

A gente olhou uma para a cara da outra, o Marquinhos ainda não existia, e a gente disse vamos pegar esse dinheiro, vamos montar a nossa unidade, mais uma coisa que eles fizeram questão, que era contratar uma pessoa de comunicação.

Na época nós achamos que a gente estava precisando de tanta coisa, como é que eu vou arranjar uma pessoa de comunicação? eu preciso de tanta coisa, é tudo tão urgente!

Bom hoje, nós não vivemos sem, então hoje a gente tem a Paula Piccin que é coordenadora e tem uma gama de pessoas.

Na Amazônia tem uma pessoa de comunicação, no Pontal tem alguém que ajuda, a Paula tem uma coordenação que junta tudo, e que dá a mesma linha mestra.

Hoje, mesmo para a nossa escola, você tem que ter comunicação e a comunicação é fundamental, porque até a gente conseguir Martins, Havaianas e Avina, ninguém sabia quem nós éramos, nós estávamos lá no meio, no final de São Paulo, Pontal do Paranapanema, extremo Oeste do estado de São Paulo.

Nós estamos lá na Amazônia, nós estávamos lá no Sul trabalhando com o mico-leão da cara preta, não havia uma comunicação para dizer quem nós éramos, o que a gente estava fazendo de importante.

Tem uma pessoa de comunicação que se dá muito bem com as TV Globo locais, então tem vários programas que já foram feitos, mostrando para quem quiser ver.

O programa semeando água que é do Cantareira e o Corredores de Vida, está tudo registrado, com comunicação.

Na hora que você vai ter uma reunião com alguém, você dá os links todos, você tem os links e essas pessoas podem acessar e vão dizer o que elas mais gostaram, que elas menos gostaram, se elas têm afinidade com a sua causa ou não e são elas que decidem.

Hoje eu tenho um portfólio que eu não tinha, imagina, nós éramos absolutamente primários, eu acho que comunicação faz parte de todas as nossas áreas.


11. CHEGANDO NO GOVERNO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

Varia de caso a caso, a gente consegue influenciar a política pública, quando a gente encontra eco com algum gestor ou de algum jeito, alguém que está mandando.

O mico-leão-preto, por exemplo, é a espécie símbolo do estado de São Paulo, porque ele só ocorre no estado de São Paulo, ele é o Mico Paulista e isso levou 7 anos para ser concretizado.

Então política pública é um processo.

Teve o Zé Pedro que levou de mesa em mesa, ele era o secretário de meio ambiente do estado de São Paulo, ele acreditou e levou adiante e aconteceu.

Outro caso que a gente também conseguiu, foi a criação de uma unidade de conservação, que é a estação ecológica mico-leão preto no Pontal, que são 4 fragmentos onde havia mico-leão.

Esses fragmentos estão sendo linkados com um corredor, para que uma família possa se comunicar com a outra e ter a possibilidade de não ter problemas genéticos e não só para o mico, nos corredores é tudo.

Eu me lembro muito bem, porque estávamos com a pessoa da Time Magazine, dando uma entrevista para Time, foi na Rio+10, em Joanesburgo, foi na África se eu não estou enganada, enfim, na Rio+10, a revista Time pegou alguns ambientalistas e descreveu como os heróis da natureza.

Claudio e eu aparecemos na revista, foi distribuída largamente na África, onde teve a reunião e eu estava com a repórter, a jornalista, sentada no Pontal do Paranapanema, numa pizzaria em Teodoro Sampaio, quando apareceu no Jornal Nacional, eu sabia porque já tinham me avisado.

Ele anuncia a criação da unidade de conservação estação ecológica mico-leão-preto, então eu falava para ela, você está aqui por um acaso, porque você está me entrevistando, mas isso aqui levou 7-8 anos, isso aqui é um processo gigantesco, é lento você conseguir fazer alguma coisa em política pública, mas beneficia de uma maneira extraordinária e com uma escala, que você como ONG, não poderia nunca fazer.

Eu acho que é importantíssimo. O IPÊ não tem esse perfil tão forte, a gente até atua aqui em Nazaré Paulista e tudo depende se a pessoa está afim de ser correto ou não ser.

A gente está contribuindo, então a gente conseguiu criar um conselho de meio ambiente aqui Nazaré, a gente trabalha por isso, mas não é o forte do IPÊ, existem outras organizações que trabalham especificamente para a política pública, como o ISA - Instituto Socioambiental.

Eu tenho grandes amigos, então se alguma coisa está pegando, eu não sei exatamente o que é, eu ligo para eles e pergunto, de que lado eu tenho que ficar, quem é o bonzinho, quem não é, então eu tenho apoio para saber o que está acontecendo e claro além de investigação própria que a gente faz.

Hoje a gente tem um dilema imenso, que é posicionamento. Eu vou assinar uma carta, eu não vou assinar, porque o IPÊ não é político, está no nosso estatuto e a gente não pode tomar partido político e eu não quero.

Porque hoje a gente sabe qual é o lado que a gente está, mas amanhã pode estar dividido, metade do IPÊ de um lado, metade do outro e só vai criar desavença, então a gente tem que tomar um certo cuidado, agora que é importante é não tenha dúvida.


12. GRANDES SUGESTÕES PARA OS PEQUENOS

O Claudio diz uma coisa que eu acho muito importante, ele diz que 1% é inspiração, 4% acho que é cooperação e 95% é persistência.

Precisa ter muito claro aonde a gente quer chegar e esse muito claro, muda, e é normal que mude, porque a realidade muda.

Eu vou dar exemplos, hoje a gente trabalha com mudança climática, isso não era um tema fundamental para o IPÊ, mas é indispensável.

Hoje têm adolescentes que estão sofrendo de ansiedade climática então a gente precisa se adequar.

Adaptabilidade é um tema, persistência e clareza, o que vai fazer diferença, o que de fato eu estou fazendo, vai ser para o meu ego ou vai ser pelo bem da instituição e da causa, porque se for pelo o meu ego, arranja outro jeito de fazer, publica um livro, faz alguma coisa.

A instituição tem que estar inteira, tem que de algum jeito, inspirar outras pessoas e aí você inspira quando você acredita e trabalha com afinco e com paixão, muita paixão.