Falta de Transparência é um Problema
Líder de Política Econômica no Instituto Talanoa explica que o Brasil está atrasado na pauta ambiental e tem governança confusa, dificultando acesso ao chamado “clube dos países ricos”.
Por Guilherme Justino, do Um Só Planeta
“Falta de transparência é um problema, e vai ser cobrada do Brasil para adesão à OCDE”, diz economista Karina Bugarin
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) concedeu, em 10 de junho, aval para que o Brasil e outros países ingressem no grupo das economias mais industrializadas do planeta. A entrada na organização é considerada um grande passo para o país, dado o potencial de aprimoramento das estruturas envolvidas em diversos temas – com grande ênfase, atualmente, em sustentabilidade – que beneficiam diretamente a economia.
Sediada em Paris, a OCDE conta atualmente com 38 países membros, incluindo Austrália, Chile, Alemanha, Japão, Portugal, Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido e Estados Unidos. Para ser aceito como membro pleno desse seleto grupo, o Brasil precisará reforçar o comprometimento com temas como democracia, agenda ambiental, direitos humanos, combate à corrupção e à pobreza – tudo de forma muito transparente, um ponto em que o país ainda peca, na avaliação da economista Karina Bugarin, líder de Política Econômica no Instituto Talanoa, think tank brasileiro dedicado à política climática.
“A OCDE não é um bloco homogêneo. Isso é importante enfatizar. Atualmente são 38 países membros, e cada país é como um universo. Então hoje são 38 universos que precisam se articular, se coordenar e caminhar juntos. A própria OCDE vai precisar passar por um processo intenso interno de especificações, de como isso vai ser feito. Não vai ser imediato. Mas é um processo em que a sociedade inteira deveria se engajar e cobrar transparência”, diz a especialista ao Entre no Clima, o podcast do Um Só Planeta.
A entrada do Brasil na OCDE é considerada uma prioridade na agenda de política externa brasileira. Também é vista pelo governo como uma oportunidade de acelerar reformas no país. Segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, a entrada do Brasil no grupo é fundamental para promover uma agenda de integração global. “Desde o início do nosso governo, fizemos movimentos decisivos em direção à OCDE. Não é só a complementação de instrumentos. É um processo longo, que pode ter algum tempo pela frente. Mas o governo colocou como prioridade”, disse ele, durante a abertura do evento Semana Brasil-OCDE, em 21 de junho.
“Chancela”
O grupo é chamado de “clube dos ricos”, apesar de incluir vários emergentes, como a Colômbia e a Costa Rica. A organização é um fórum que discute e promove políticas públicas em várias áreas e realiza ainda uma série de estudos internacionais. Ser membro efetivo da OCDE é visto como um “selo de qualidade” que impulsionaria a economia dos países.
A expectativa do governo é de que esta chancela dê acesso a grandes investimentos: isso porque os maiores fundos do mundo têm, entre suas regras de funcionamento, determinações para investir seus recursos majoritariamente em países da OCDE, que se comprometem com regras de transparência regulatória.
A OCDE tem 251 instrumentos de boas práticas a serem adotados pelos seus países-membros, e o Brasil ainda precisa aderir a grande parte desses instrumentos para conseguir a vaga na entidade, explica a líder de Política Econômica no Instituto Talanoa. No início de junho, a OCDE aprovou os “roteiros de acessão” do Brasil e de mais quatro países – Peru, Croácia, Bulgária e Romênia – ao grupo. Cada país terá o plano de adesão avaliado por comitês da OCDE ao longo dos próximos anos.
“O próprio governo federal não está conseguindo se articular e manter uma governança sólida. E isso é muito complicado. Vemos um papel cada vez mais reduzido do Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores), que vinha sendo um órgão fundamental nas negociações. E agora temos declarações do ministro de Relações Exteriores indo para um caminho, e declarações do ministro de Meio Ambiente indo para outro, e o ministro da Economia indo para um terceiro caminho. Então a própria governança e a estrutura interna do governo estão confusas. Não estão transparentes”, garante Karina.
Necessidade de mudanças
Em nota, a OCDE diz que o processo de adesão do Brasil incluirá uma avaliação rigorosa e aprofundada do alinhamento do país candidato com as normas, políticas e práticas difundidas pela entidade. “Antes de qualquer convite para ingressar na organização como membros, serão necessárias mudanças na legislação, na política e nas práticas adotadas dos países candidatos para alinhá-los com os padrões e melhores práticas da OCDE, servindo assim como um poderoso catalisador da reforma”, define o comunicado.
Para ser aceito como membro pleno da OCDE, o Brasil precisa se comprometer a aderir a uma série de boas práticas – entre elas, a simplificação do sistema de cobrança de impostos com uma reforma tributária, por exemplo – e demonstrar comprometimento com a proteção do meio ambiente, da biodiversidade e no combate à crise climática. O Brasil ainda precisará reforçar o foco em diversos temas e valores que fazem parte da organização, criada após a Segunda Guerra Mundial.
“Todo mundo quer ser verde. Todo mundo quer ser sustentável. A intenção está ali, está posta. Agora, como isso será cobrado? E como caminharemos e levaremos isso a sério dentro do processo da OCDE? Precisamos ter conversas regulares e abertas”, pondera Karina Bugarin.