Ilona Szabó: Muitas Outras Vozes Precisam Ser Ouvidas e Ter Espaço nas Mesas de Discussão e Decisão
Presidente do Instituto Igarapé estará em julho na abertura da Conferência da Glocal, que reunirá lideranças em torno dos objetivos para 2030 da ONU
A cientista social Ilona Szabó, liderança reconhecida internacionalmente em campos como o da segurança, participa da abertura, no dia 13 de julho, na Marina da Glória, da Conferência da Glocal Experience. “Mais do que nunca, precisamos sentar juntos, pensar juntos e construir as saídas para os nosso desafios comuns”, diz a empreendedora e presidente do Instituto Igarapé, que fará um convite ao diálogo. A programação reunirá representantes locais e globais para debater os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU até 2030, como erradicação da pobreza, igualdade de gênero e água e saneamento para todos. A Glocal Experience é uma iniciativa da Dream Factory, com co-realização da Editora Globo e os parceiros oficiais de mídia O GLOBO, Valor Econômico, Extra e CBN.
Como será a sua fala no painel de abertura da Conferência?
A gente tem problemas locais e globais interconectados, desafios muito grandes em temas que são de interesse comum, seja na questão climática , de saúde pública em decorrência da pandemia e na de aceleração digital, sem falar da guerra, com impactos diretos na segurança alimentar. Em um momento de tantas crises, a gente também vê intolerância, polarização, uma volta a um populismo nacionalista que não aceita e não fortalece a cooperação global e o multilateralismo, e isso é muito perigoso. Todo o foco do painel será mostrar a importância da construção coletiva e plural, sobre regras democráticas, das soluções dos nossos desafios. Temos um mundo onde muitas outras vozes precisam ser ouvidas e ter espaço nas mesas de discussão e decisão. Farei um convite ao diálogo.
Boa parte dos atores na Glocal vira dá sociedade civil. Pode vir desse campo a esperança de um mundo melhor?
Sem dúvidas. Em uma democracia, a gente só consolida os avanços, os direitos e as responsabilidades quando há uma sociedade civil atuante, independente e forte. Estamos vivendo um momento de perda do espaço cívico sem precedentes desde a redemocratização. Isso coloca também muita pressão nos grupos da sociedade civil, e são muitas as pautas urgentes, muitos os temas desconstruídos. A gente espera que qualquer resultado da eleição traga a possibilidade de retorno da participação cívica. E que a gente consiga voltar a sentar na mesa com quem pensa diferente, mas defende o interesse público e tem princípios comuns.
Como alcançar objetivos tão urgentes?
Precisamos passar por cima de diferenças e construir respostas baseadas no nosso atual e melhor conhecimento, nas tecnologias disponíveis, nas experiências nacionais e internacionais, olhando as lições para dar o salto que o Brasil precisa. Há os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e o Acordo de Paris. Não conseguiremos avançar sem que o governo priorize essas metas, sem que a sociedade participe e sem incluir de forma responsável o setor privado, em especial quando se pensa na transição climática e ambiental.
Falando de Brasil, quais são as metas que mais preocupam?
Não dá para aceitar tanto retrocesso na segurança alimentar. O combate à fome deve ser imediato. Há também a geração de empregos sustentáveis, já alinhados às economias do futuro — a ambiental, a criativa, a digital e a do cuidado — e muitos desafios em relação à insegurança, corrupção e impunidade. E não posso deixar de falar da mãe de todos os desafios, pelo pouco tempo para equacioná-lo: criar resiliência climática. Não basta mais buscar neutralidade de carbono; temos que buscar a proteção da nossa natureza e dos povos originários e tradicionais.
Na Amazônia, o Igarapé trabalha junto a mulheres que defendem a floresta e são alvos de ameaças. Como vê esse cenário?
No Igarapé, atuamos no reforço do cumprimento da lei para viabilizar o desenvolvimento sustentável na Amazônia. Temos três pilares: compreender o ecossistema do crime ambiental; fortalecer a governança de comando e controle; e trabalhar a transparência, com uma análise de risco mais comprometida do setor privado para atrair capital responsável. Sobre o primeiro pilar, o Brasil figura nas listas dos piores países do mundo em se tratando de violência contra defensores da floresta, mas a perspectiva de gênero é pouco trazida ao debate. Estamos trabalhando com defensoras de diferentes regiões da Amazônia, e elas mesmas estão mapeando as redes de proteção existentes e fazendo pesquisas para compreender melhor as dimensões da violência e as possíveis respostas em políticas públicas.
Você já foi alvo de misoginia e ataques nas redes. Como ser atuante sem se deixar contaminar pelo ódio?
Há muitas pessoas no Brasil sendo atacadas e me preocupam as que estão em linhas de frente. Mais do que nunca, temos que nos unir e criar redes de proteção e coalizões, dar visibilidade a boas soluções, não aceitar quando limites são ultrapassados e exigir justiça quando ataques chegam a vias de fato, como no caso de tantas lidernças indígenas, dos indigenistas Bruno e Maxciel e de Dom Phillips, por exemplo. De maneira alguma podemos deixar que seja normalizado esse estado de coisas. O que nos move é que, juntos, somos mais fortes.